Ponto de vista – por Jorge Kuster Jacob
Não temos muitas informações, pesquisas ou reportagens sobre o uso da música ideologicamente falando na Ditadura Militar Brasileira de 1964 a 1985.
Mesmo assim, podemos afirmar que a ditadura não foi só militar, política e econômica, foi também cultural. Para alienar o povo, o imperialismo cultural americano impôs sua cultura aos países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento. A música e o cinema americano foram estrategicamente usados para manipular o povo brasileiro.
Podemos citar algumas bandas e diversos cantores brasileiros que chegam ao cúmulo de mudar o nome português para um nome artístico inglês para assim ser aceito no mercado cultural da época. Mas não ficava apenas na americanização do nome. A música tinha que ter letra em inglês. Nomes de cantores e músicas brasileiras ou portugueses não vendiam ou não eram curtidas, especialmente pela nossa juventude. Os cantores sertanejos tinham espaços apenas em circos e em emissoras de rádio até o fim da Ditadura Militar (1985). A Música Popular Brasileira (MPB) tinha espaços nos teatros e universidades da época. A TV Globo, por exemplo, em suas novelas só tinha músicas em inglês.
A partir de 1980, houve no Brasil uma grande exploração comercial da música sertaneja, começando com Chitãozinho & Xororó e Leandro & Leonardo, passando posteriormente para uma grande quantidade de duplas, tendo seu auge entre os anos de 1988 e 1990. A população urbana não curtia a música sertaneja até 1988. Era considerado “brega” de “gente da roça”. Bastou as emissoras de TV usarem músicas sertanejas como temas de novelas e esse quadro mudou. Ou seja, a música sertaneja passou a ser consumida também pela população urbana.
Vamos citar alguns nomes de cantores bandas e músicas “inglesas” usadas ideologicamente durante a Ditadura Militar:
– “Steve Mclean” – era Hélio Eduardo da Costa Manso que se lançou com esse pseudônimo e fez muito sucesso em todo Brasil com a música “True Love”, tema da novela da Globo “O Grito” (1975) e a “Sweet Sounds,” música da Novela Locomotivas (1977).
– “Manchester” – Banda que emplacou a música “My Dear” da novela “Duas Vidas” (1976).
– “Richard Young” – era Ricardo Fegghalli que cantava a música “Rainy Day” da novela Locomotivas (1977). Hoje, cantor do Grupo Roupa Nova.
– “Fholas” – banda paulista emplacou diversos sucessos como a “My Mistake”, (1972). Seu vocalista principal era Ney Matogrosso.
– “Lee Jackson” – banda da música “Hey Girl”. (1970);
– “Paul Denver” – era Carlos Alberto de Souza com a música “Rain and Memories”;
– “Light Reflections” – banda que vendeu milhão de discos com a música “Tell Me Once Again”. Depois Ney Matogrosso fez uma versão.
– “Peter Duanaway” – era o Otávio Augusto Fernandes Cardoso hoje dono da Som Livre e RGE com a música “I’ II Be Fine e Believe Me Darling” (1970).
– “Dave Maclean” – é José Carlos Gonzáles com a música “Me and you” (1973).
– “Don Elliot” – nada mais era do que o Ralf da dupla sertaneja “Christian e Ralf”.
– Chrystian – era José Pereira da Silva Neto não podia aparecer na capa dos discos era cantor da música “Don’ t Say Goodbye” (1973) e é irmão de Ralf.
-Mark Davis era Fábio Junior com a música “Don’ t Le Me Cry” da novela “A barba azul” (1974).
– Tony Stevens – era Jessé da música “Porto Solidão” que cantava em inglês, “If you Could Remember e Flying High”.
– “Morris Albert” – era Maurício Alberto Kaisermann, o maior sucesso da época. Fez sucesso em mais de 50 países. Teve músicas gravadas por Júlio Iglesias e outros cantores fora do país com a música “Feelings”.
– Michael Sullivan – da “Banda Renato e seus Blue Caps” era na verdade Ivanilton de Souza Lima que a gravadora só aceitava gravar a música “My Life” se mudasse seu nome para um nome inglês. Ele procurou na lista telefônica e juntou esses dois. Foi o maior sucesso da novela “O Casarão” (1976).
O patriotismo propagado pela ditadura excluía todos aqueles que não aceitavam as arbitrariedades do regime, com sua violência, ou com sua política desenvolvimentista dependente do capital internacional e altamente concentradora de renda.
Na verdade, o patriotismo durante esse período se submetia ao poder econômico das grandes gravadoras e canais de televisão. Com a abertura política e a constituição de 1988, essa realidade começa a mudar. A história e a identidade cultural rural fazem parte das grandes duplas sertanejas. O cinema, os meios de comunicação, em especial as emissoras de televisão passam a explorar esse tema.
Com a Constituição Federal (1988), Estadual (1989) e as leis orgânicas Municipais (1990) e a interiorização de universidades e a volta da democracia, as manifestações culturais da zona rural passam a fazer parte da história brasileira com muita mais determinação. Hoje temos movimentos culturais que colocam as manifestações tradicionais dos povos e comunidades rurais no palco dos nossos municípios. A agricultura, a pecuária familiar, os povos e comunidades tradicionais passam a ter a sua identidade histórica, cultural, econômica e turística como roteiros de visitas de turistas e assim gerar não só uma maior autoestima, como servir de fator de geração, de renda e emprego e contribuir com o desenvolvimento econômico local e sustentável. Até mesmo o conceito de patriotismo foi “interiorizado” ou “ruralizado”.
Curtir a história, a cultura, o paisagismo local ou do seu município é ser patriota. Até mesmo porque atualmente as cores da bandeira e outros símbolos da nossa nação estão sendo muito politizados. Esses símbolos deveriam ser de todos os brasileiros e não usados por uma facção política.